GP da Rússia: Questões pragmáticas

GP da Rússia. E como o Vladmir Putin, eu cheguei um pouco atrasada, mas ainda em tempo de fazer algumas coisas, como no caso, comentar o evento.

Tínhamos 21 corridas para a temporada, já estamos na de número 16. Faltam 5 e o que nos restou para essas demais 5? A mesma coisa, desde meados de 2008.
2007 foi o último ano da qual o resultado surpreendeu uma boa parte, se não todos. E no fim, na última corrida, que naquela época ainda era em terras brasileiras. Desde então, 2008 era mais na cara que nariz, pelo menos para mim, que um piloto mediano não seria campeão mundial (mesmo que tenha sido por alguns segundos e mesmo tendo um adversário inconsistente).
2009 foi atípico, por assim dizer, mas ele já estava desenhando uma tônica que faria da F1, na década seguinte, previsível: a decisão do campeão mundial algumas corridas antes do fim da temporada. Assim, desde 2009, nos colocamos - caso não gostemos do piloto vencedor por antecipação - a torcer pelo segundo colocado. Porque fazemos isso? Porque somos bem bobos e viciados. 
Em termos práticos, ninguém lembra do vice, a não ser que seja um ser que gosta de implicar e "zuar". Mas em termos de história do esporte, o nome do vencedor é escrito em letras garrafais e em neon. Pode ter uma notinha sobre a rivalidade com um outro, que calhou de ser vice, mas, muda-se o nome e a escrita é sempre romantizada. 

Aposto que vocês já se lembraram dos 4 anos seguidos em que Vettel foi campeão. Por antecipação: 2011, com 4 corridas e em 2013, com 3 corridas antes do fim da temporada. 
O choro sempre foi livre. Mas a opinião caquética, nem sempre. Há quem afirme que o mesmo só conseguiu tais títulos porque tinha nas mãos "o melhor carro".


Gostaria de um favor. Apenas parem. Dou duas razões para pararem com esse papinho tosco: 

a) O melhor/bom carro nas mãos de um piloto mediano, não dá em nada. Exemplo? Massa em 2008 e Barrichello em 2009. (Mas eu não disse os nomes de Webber ou Rosberg, vejam bem...). 

b) Se o Vettel tinha "o melhor carro, nhenhenhém" e "só sabe vencer com carros ótimos..." Hamilton é ainda pior que ele posto nestes termos. Quando a McLaren começou a ruir, ele desapareceu do grid. Foi superado por um piloto que todos dizem ser ruim para médio. Pediu para sair, e foi correr com "o melhor carro do grid". Detalhe: Ele corre de motor Mercedes desde que pisou na F1. Assim sendo, desde que a estrutura de carro esteja excelente, ele tem triunfais aparições. 

Nas duas circunstâncias, se continuarem a dizer que o Vettel só vence com o melhor carro, é preciso dar crédito que ele pelo menos, não corre com o mesmo motor desde que começou. Dito de outra forma: ele dá a cara a tapa. 
E isso também exclui aquele papo tão bobo quanto de que Hamilton está na frente do campeonato porque está "ganhando no braço".
Ninguém abre 50 pontos de vantagem "no braço", por antecipação, na corrida 13, de 21. Ainda mais depois de 2009. Tem sim o carro mais equilibrado e uma vantagem que o Vettel não tem: dirigentes que estendem tapetes para ele e não dão murros em ponta de faca comentendo erros abichornantes quando não totalmente risíveis.

Assim, voltamos ao contexto: tivemos corrida 16, faltam 5. Rússia já é uma pista com poucos atrativos. Ruim. No máximo, tivemos Verstappen fazendo os nossos olhos encherem de maravilhamento. Mas o pobre ser, não teve nem sequer lugar no pódio por conta das regras de pneus.
Aí de repente, uma "novidade": jogo de equipe, desfavorável e intrinsecamente podre aconteceu para colocar toda a nossa bílis em ação. 
Mas aquela máxima surgiu: "A Ferrari também faz isso!" 
E quando pior: quando faz, faz mal ao esporte, ao automobilismo. É suja. Fede. "Mata" a competição e deixou o "corpo" à míngua.
Quando a Mercedes faz, alguém pode até dizer que é feio (a transmissão com o Galvão disse, até ser chato como sempre). Mas a justificativa logo pairou (inclusive entre eles): esses jogos de posições sempre houveram. 
Mas só uma é "o ninho das cobras", "a detonadora de carreiras", "gente vil e baixa".
parece nossa politicagem brasileira, não é? Parece que todo mundo tem uma necessidade de maniqueísmos, que se não fizer, solta pus pela pele...



Apesar do que realmente importava na corrida, essas discussões tomaram conta do que real necessário: habilidades, saúde de motores, estratégias bem pesadas, etc. O teatro foi montado: fingiram que foi uma decisão desesperada a troca de posições. Hamilton fez a sua parte no diálogo: mentiu que tinha problemas no pneu. Maquiou uma situação que a gente sabe que não era real. Eles vivem fazendo isso. E não é a primeira vez que ele faz um completo cosplay de Pinocchio. 
Com o fim, a equipe, fala no rádio do Bottas, que depois vão explicar pra ele a decisão. A decisão que já estava combinada. Ou vocês acham normal aquela lambeção de botas com o Bottas, no sábado? Desculpe o trocadilho, mas Hamilton lambeu o Bottas que nem mãe-gata com seus gatinhos recém nascidos. E ele só fez isso porque a tenda estava armada. E os trouxas acharam que foi "atitude desesperada"... 



Há que se convir que, na hora do ato, Bottas deixou parecer uma insatisfação ao abrir muito espaço para o companheiro. Pareceu que deixava claro que houve o mando e que então ele não ia forçar a barra/ dificultar, por pirraça. Deixou a coisa ainda mais feia, só que para o lado do Hammy-Hammy. 
Este ano Kimi ouviu um "deixa ele passar" no rádio, e teve gente usando o caps lock no Twitter para o Vettel como se fosse um grito que ele ouviria: "Não é bom? Então passa sozinho". Houve quem chamou o alemão de nomes muito feios, e nem são fãs do Räikkönen.  
Vimos o mesmo com o Hamilton? Ah, nem 1/3 do esperado. O homem é intocável na pista, e não é criticado quase nunca. Mesmo sendo tão mesquinho quanto qualquer outro.

No fim, Bottas não é digno nem de ser compatriota do Kimi. Achava que finlandeses eram frios e até grossos. Ele até esboçou sorrisos sem graça e aceitou, de bom grado, aquela cena ridícula do pódio.
Já digo que perdi a vontade de tentar defender Bottas, ou ainda dizer que tenho dó. 
Ele sabe muito bem onde é que se enfiou. Foi um paspalho de marca maior. 
No pódio e na entrevista, poderia ter virado as costas, feito cara feia, evitado olhar na cara do companheiro e dado declarações do tipo: "eu merecia, eu lutei por isso e não estou satisfeito". Não que ia resolver, mas pelo menos não ficaria com essa cara passiva e diplomacias.
Até porque, sejamos pragmáticos: a Ferrari todas as vezes que fez jogo de equipe, assumiu que os tais pontos eram imprescindíveis para o campeonato. Doeu? Problema. Foi feito e pronto. 
Hamilton tinha uma enorme vantagem. Não precisava de mais, afinal, falam que ele chega campeão depois do México, mas já enfiem na cabeça que no Japão ele já sai com o título para os EUA. Não precisa de conta e ficar pensando que o Vettel pode vencer e blábláblá porque a gente sabe que precisa do Lewis não marcar pontos para dar esperança pro Vettel e isso é impossível. Não tem quebra, não tem pneu explodindo, e não tem um miserável para errar e bater nele. Esse papo é só para dar margem para assistir as outras corridas. Quem gosta vai ver sem precisar de propaganda desse tipo. Quem gosta de verdade sabe que é ridículo pensar que exista alguma chance para o Vettel. E isso, já suspeitamos desde a Bélgica e confirmamos em Monza. 

Mas voltando ao Bottas; o que ele fez naquele pódio? Sorriu amarelo e foi cordial em todas declarações. 
Depois o Kimi é que é o capacho, mercenário. Ou para fãs, o humilhado e desprezado.


O rádio da Mercedes, marcou o começo do fim de uma encenação tocante, que ainda tinha mais um capítulo a ser escrito. 
O Pinocchio Hamilton tem um futuro nas artes muito bem delineadas. Minhas partes favoritas, das interpretações shakesperianas foram:

Cena 1: "Meu amigo, Valtteri", do sábado.
Me fez arrepiar os pelinhos do braço! Que bonito era ver a amizade entre dois companheiros de equipe, genuinamente transposta em imagens! 

Cena 2: "Alguém me ajude, por favor!"
Essa me levou à aflição!!!! Comoção total, o caos...! Tanto que nem lembro se eram bolhas nos pneus, de tão afobada que fiquei: elas podiam dar um final mais trágico que foi em "Édipo Rei". Sofri mesmo. Era o fim último de uma tragédia grega: suscitar o compadecimento com o herói. E eu fiquei com pena... oooooooooooh!

Cena 3: "Tome o meu troféu, é seu por direito."
Apesar de não ter fim trágico, essa cena me levou às lágrimas. Não houve um piloto na história da F1 que tenha feito isso. Chamar o seu companheiro para o primeiro lugar por ter feito uma troca de posições e ambos ficarem sem graça e com os rostos visivelmente desconfortáveis - um com raiva e medo - e o outro fechado e envergonhado.  Que nobreza, que atitude! Foi tão inovador quanto é técnica do CGI para personagens virtuais em filmes de ação.

"Vai enganar outro, rapá!"

A Liberty falhou. Ela nos prometeu algumas mudanças. Nos prometeu entretenimento. Acabou por nos dar doces ao invés de refeições completas: aproximarmos mais dos pilotos, termos uma interação maior via redes sociais, no afã de trazer mais holofote à categoria é o que tem, mas não é o que nos nutre. Assim, a F1 continua a mesma, só que agora, é como se fosse uma nota de 3 reais. A mídia não importa, pois a F1 e a FIA fazem tudo para ter um frisson em cima do que eles acham que é bom e agrada. A F1 ultrapassou o limite do insuportável do tédio com essas corridas em circuitos toscos e com os protagonistas sem carisma e esnobes. Sempre houve os esnobes? Sempre. Mas eles também sabiam ser nobres ou geniais. Hoje o que tem é corpo tatuado, roupas da moda e brilhantes nas orelhas, e muita soberba.

O fugir da entrevista pós corrida que Hamilton propiciou é claro sobre o que é a F1 hoje, já que Liberty quer essa mídia louca para ganhar muitos cifrões: "estou cagando para todos, para fãs do automobilismo, para a categoria". O "vou sair da McLaren pois aqui não posso levar o que é meu, meus troféus que conquistei, para minha casa" é o fim máximo da categoria encarnado; categoria essa que a gente ama e sofre tanto, por dedicar um tempo à assistir. 
Aceitar de bom grado esse tipo de figura a ganhar o quinto título mundial, é intragável pois já ultrapassa o sentido da torcida por si só e deveria ser inadmissível em termos de esporte que pressupõe não só jogo limpo quanto carisma do atleta.

Abraços afáveis! (Mas sem uma aparente cólera - por conta do texto - juro que o abraço é sincero).

Comentários

Tu bem sabe que não perco uma uma corrida, mas muito por conta do desânimo causado pelo Vettel desde o GP da Alemanha, acabei aceitando ir com a família a um sítio justo no horário dessa corrida. Não perdi nada, não é mesmo? E muito provavelmente não vou ver com a mesma paixão os GP's restantes, justamente para não ter que aturar a cara desse mimado e queridinho "showman" da F1, que pilota de forma heróica, no braço, desafiando as leis da gravidade e vai ser o maior e melhor de todos os tempos, depois do deus Senna, claro...

A F1 está chata, enfadonha, mais mercantilista e deixando de dar tesão. Dois anos seguidos que o Vettel e Ferrari dão as mãos e pulam da beira do precipício. Assim, fica fácil para o outro ganhar corridas e títulos. Agora o que me resta é torcer para um meterito cair justamente no carro 44 durante um treino ou corrida, pois só assim para termos uma reviravolta...
Manu disse…
Eduardo: Só meteorito mesmo (embora precisássemos dele também, dia 7 de outubro, convenhamos...) para que o resultado seja diverso. Agora pense comigo: se acontece um desastre, o coitado do Vettel ainda não tem holofote nenhum. O amor latente pelo inglês é irreversível.

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