Balanço da Temporada F1 2020 (parte VIII - A)

Depois de um GP em que nenhuma das duas Ferraris marcaram pontos, até Toto Wolff veio comentar sobre a má fase da Ferrari. Com razão, o chefe da Mercedes foi pragmático, conforme comentei no post de notas ácidas, pós GP da Bélgica. Toto apontou para a necessidade em questionar as prioridades que foram definidas nos últimos tempos e de onde vem a falta de desempenho, acrescentando ainda que tais resultados não são merecedores, nem para quem trabalha lá, nem para quem torce por eles. E então veio a cutucada na ferida: "Talvez sejam as decisões que foram tomadas dentro da equipe, de certos membros da equipe"; o que foi traduzido como uma crítica à administração de Mattia Binotto.

Esse cara, no entanto, na mesma ocasião tratou de calçar umas desculpas esfarrapadas para a situação da equipe declarando só um pouco mais da sua inépcia. Binotto negou o termo "crise", alterando para  "tempestade", no intuito de afirmar que passaria, uma vez que sabia de todos os problemas de potência e ineficiência aerodinâmica desde os testes de inverno e para piorar, ainda citou a impossibilidade de desenvolver o carro... 

Além disso, passou despercebido para muitos, mas Luca de Montezemolo, andou palpitando de forma mais contundente que Mattia, e estando mais longe da casa do que ele. Dizendo que a crise (sem usar outro termo) é uma sucessão de erros, ele jogou limpo: "Pensavam que poderiam vencer com um estalar de dedos", é a premissa que sempre acho que pauta a tradição fazendo o trabalho duro na conquista de resultados e por isso, seguiam (e talvez continuarão a seguir) recebendo de resultado o fracasso. Luca disse mais: "Subestimamos a complexidade da nova unidade de potência. Em comparação com a Alemanha, não tínhamos cultura de motores híbridos na Itália". Na soberba, os caras agora, pagam caro por serem molengas e destroem carreiras de pilotos em escala industrial, culpando estes de algo que não tiveram (ou têm) controle.

Às vésperas do GP de Monza, Binotto voltou atrás: admitiu que viviam uma crise e que ele era o primeiro nome a aparecer na lista dos responsáveis. O nó da corda estava frouxo, pois ele finalizou a declaração culpando as circunstâncias: voltou à desculpa do motor congelado e que não havia muito a se fazer naquele ano. O máximo que podia dizer era para terem paciência. 

Depois de dois GPs bem ruins do seu piloto prioridade máxima Charles Leclerc, dava para desconfiar se ele tivesse um grande resultado em Monza. Lembrando que Leclerc conseguiu dois pódios com esse "motor congelado" da Ferrari: um segundo lugar na Áustria (etapa 1) e um terceiro no GP de Silverstone (etapa 1). Porém, não dava para não dizer que era um trabalho exclusivo da equipe para que isso acontecesse. Ele também contava com uma boa dose de sorte: as duas conquistas caíram no colo do monegasco com as falhas de outros pilotos à frente, mas isso foi ignorado massivamente pela imprensa especializada e outros comentaristas de sofá. Tornou-se, em um *flash*, o "piloto que faz milagres com uma carroça".

Só por isso, achei que o vexame ficaria - de novo - nos ombros de Sebastian Vettel, para Monza. Depois verificamos se foi isso mesmo.

Saindo do assunto Ferrari e indo à rainha Mercedes: ali nada foi alterado, no último GPs a não ser uma virada de ideia (particular) em relação ao desempenho de Valtteri Bottas. É particular porque ninguém parece propenso ou interessado à dar valor aos detalhes. 
Na corrida da Bélgica, logo nas primeiras voltas, Bottas perguntou ao engenheiro sobre a tática de ultrapassagem sob Lewis Hamilton que já estava se distanciando. Recebeu de resposta que haviam combinado não usar um contra o outro. Bottas fingiu desentendimento e Toto explicou que poderia ter sido falta de comunicação. Estrategicamente, a ultrapassagem entre eles não iria ocorrer, pois não queria que Max Verstappen se beneficiasse da disputa interna.

Ainda que soasse como falta de entendimento do Bottas, eu acho que ele fez de propósito comentar sobre isso no rádio para que ficasse às claras que ele não avançaria sob Lewis, porque a equipe não permitia.
Depois disso, dei o benefício da dúvida em relação ao grau de habilidade do piloto da bela voz: Se Bottas era ruim para estar na Mercedes, eu não poderia (e ainda não posso) ter certeza. Ele me pareceu  bom nos tempos de Williams. Seu ano de estréia foi mesmo, aquém do esperado: um 17º na classificação geral. Mas como companheiro de Felipe Massa nos anos seguintes, ele não deixou a desejar, embora, a bancada dos puxa-sacos coloquem problemas nessa afirmativa: o finlandês foi, em 2014, 2015 e 2016 - o 4º, 5º e 6º na classificação geral, em queda, mas constante, enquanto o grande Massa ficou com 7º, 6º e 11º. 
Ai, ai, ai-aiai... Sendo o brasileiro, "tão bom e experiente", ex-Ferrari, se esperaria mais, não? Pois isso está - como sempre - debaixo do tapete. 

É um tanto ingênuo esperar que Bottas, vindo depois de Nico Rosberg, possua carta branca para enfrentar Lewis. A petulância do Nico em 2016 foi muito mais, a meu ver, pela sua história na casa. Ele estava lá quando a equipe voltou para a categoria em 2010. O desenvolvimento do carro que eles tem, hoje, deve a ele e muito mais ao Michael Schumacher. 
2016 foi meio que um "deixa ele" - que acharam que não iria fazer mal - e foi algo não vai acontecer com Bottas. Não devem nada ao finlandês, a não ser garantir que ele seja sempre vice e a bucha de canhão para as ameaças. 

Isso significa que estou admitindo que Hamilton é genial?
Na verdade não. É notável que tenha talento, mas não exageramos aqui nessa página (não, pelo menos, nesse sentido).
A questão é que dois corpos não ocupam o mesmo lugar. Só um pode haver um campeão. E é o que fala mais alto dentro de uma equipe, no caso. Se fosse por termos de competitividade, ele estava sofrendo com um companheiro, de igual para igual.

Assim, a Mercedes tem a sua preferência. Isso ficou claro em várias oportunidades e em 2020, foi neste momento.
O fato de dominarem a retórica, não significa que não estão ocultando a principal estratégia. O discurso está montado para que se acredite que eles não tem um piloto favorito. Mas se não tivessem mesmo, não teriam podado Bottas, no rádio, naquele GP da Bélgica. Ainda arrisco dizer mais: não teriam podado um cara que, como dizem, é tão inferior à Lewis. Quem não deve, não teme. 


E por falar, quem não deve não teme... A "desculpa" sobre o avanço de Max, estará melhor detalhada ainda neste texto. Antes, vou expandir uma opinião aqui.
Ontem, no Twitter, um pessoal decidiu cancelar Mick Schumacher por uma resposta específica em uma entrevista (se quiserem conferir, aqui vai o link). Numa das perguntas, quiseram saber a opinião dele sobre o ativismo do Hamilton. O que ele disse de tão grave? Apenas que preferia não comentar. 

Vejo nessa resposta evasiva, dois sinais de inteligência:

1) Se resguarda de não dizer nada que ofenda Lewis e/ou quem concorda com ele;
2) Não comenta sobre algo que não lhe diz respeito.

Para a turminha do cancelamento, isso foi interpretado de outra forma. A falta de entendimento cognitivo desse pessoal é de doer na alma...
Parece correr atrás do rabo, mas vamos lá: Nem todo mundo está propenso a falar por falar, ou o que se pretende ouvir. Nem todo mundo acha que deve opinar sobre tudo. Não há sábio nesse planeta que saiba discernir as coisas com sensatez, o tempo todo. Então é o seguinte: o silêncio é a melhor das opções, ultimamente. Mostra superioridade diante dos idiotas - que são maioria, como se percebe.

Mas o que isso tem a ver com a postagem, já que estamos falando da temporada de 2020 e não, a offseason de 2021? Pois vou adequar: A contradição dos júris do cancelamento, está às claras - após o fim do GP da Bélgica, Hamilton disse que foi um dos seus GPs mais difíceis, por conta do gerenciamento de pneus. Já Max Verstappen disse que tinha sido uma corrida muito chata. 

Logo, Lewis acatou a ideia da monotonia da corrida e acrescentou que se fosse fã, teria feito como na época de Michael Schumacher: visto a largada e voltado a dormir.
Vejo aí, dois motivos muito mais passíveis de cancelamento do que a isenção de comentários de Mick:

a) As vitórias - que ele sempre sustenta que são todas difíceis de alcançar - só para engrandecer o feito - e que trabalha-se duro para obtê-las, é um discurso manjado e tornou-se patético colocado depois do GP da Bélgica: Se foi chata, não foi difícil. Assim, Lewis soou sumariamente contraditório;
b) Na sua fala, ele diminuiu Schumacher pai, um dos maiores do mundo. Provavelmente porque estava próximo de ultrapassar o alemão em recordes de vitórias e igualar em termos títulos, então já se sentia confortável em menosprezar a história do alemão. 

Houve cancelamento? Claro que não!!!!

Logo ele retirou da reta, dizendo que corridas monótonas não era culpa da Mercedes ou dele, pois faziam um trabalho duro e pilotos merecem estar no topo porque passaram por todas as categorias... Então, porque mencionar a era Schumacher como se fosse mais problemática, se acredita que todos tem direito de holofote?
Quem deveria ser criticado é quem formula as regras e toma decisões sobre design de carros, disse ainda. 
Finalmente concordamos com Hamilton nessa: a era Schumacher incomodou e deram o jeito de fazer umas mudanças. Pena que é só conversa para boi dormir e a Mercedes ainda demora experimentar a sua decadência.

Não estão convencidos de que deveria ter sido "cancelado"? Então, aqui vai: 

Ele também quis comentar, desta vez sobre que não lhe dizia respeito e não foi cancelado: disse que a Red Bull não tinha um segundo piloto à altura para auxiliar Max. Jogando terra ao que já estava no buraco - Alex Albon - ele ainda disse que passou por isso na era McLaren, numa fase em que fez tudo sozinho. Ele se referia à Heikki Kovalainen, pois não poderia estar falando de Fernando Alonso - que terminou 2007 empatado  não "tomou pau do Lewis" como dizem - ou Jenson Button, que no caso, foi quem deu a "paulada" nele.
Desrespeitoso, né? Não???
Foi cancelado?  *Surpresa, Surpresa!!* Também não!

Sabem o que é super bacana? O cara dá várias dessas e ninguém fala nada. Aí vem um molequinho (que nem o Lando Norris) sendo duro com uma opinião sobre o cara, e o mundo fica em ruínas...


Nas minhas notas ácidas pós GP da Bélgica, eu até comentei sobre isso. Bastava que um outro piloto falasse algo semelhante que viria os juízes meterem o dedo na cara... 
Tão previsível quanto patético.

No fim das contas, o argumento básico era que Albon estava entregando poucos resultados e Kovalainen era ruim. Lewis estaria - sob esses parâmetros - sendo apenas sincero. 
Ok, pode-se até dizer isso, se não fosse um detalhe. Não quis manifestar respeito pelos caras? Tudo bem, ele tem todo direito disso, mesmo que não tenha sido intencional. Ao contrário do que se pensa, não sou a favor da chibatada em praça pública. Só não acho legal o cancelamento seletivo. Se ele pode, os outros, também.
Eu faria diferente, e esperaria do piloto que eu admiro, uma postura mais diplomática. Se não for o caso, vou criticar também, mas cancelar, aí já é arrogância demais.

Nisso há um detalhe aí muito mais amplo que toda essa questão de passar pano ou não. Ela está nas entrelinhas, e corrobora com o que foi dito pelo Toto em relação ao rádio de Bottas: para Lewis era muito difícil admitir que Verstappen estava fazendo um grande trabalho com um carro muito inferior ao dele. Nesse caso, sabe, mais do que nós, comentaristas de sofá, mais que insiders entendedores de tudo e mais um pouco (será?) que o verdadeiro "genial" estava sendo o holandês. Verstappen com a McLaren em 2008 e 2009 teria sido melhor do que Hamilton, pela postura combativa que tem mostrado desde sua estreia. Ele lá, em 2010 e 2011 então, nem se fala!
É melhor usar o discurso de que a RBR era inferior porque Max estava sozinho do que admitir que ainda assim, ameaça as Mercedes e ele mesmo. 

Tradução: "E a verdade os libertará"

No mesmo post (ler aqui, se quiserem) havia ainda um impasse sobre o futuro de Vettel que incomodava. Não pela demora, mas pela imprensa, que atirava para todo lado. Alguns até acreditavam que ele tomaria um lugar na Mercedes. 

A possibilidade nunca existiu, a não ser na ideia de que Seb queria um carro competitivo, ou estaria fora da categoria. As opções era a ida à Racing Point, mas também insistia-se num retorno à Red Bull - que já tinham negado e a Mercedes, também com as postas fechadas. Sobrava a Renault, que havia acertado com Fernando Alonso um pouco antes. Nisso, a imprensa fazia a gente de besta com os palpites. Custava muito esperar a resposta dele, quando ele quisesse revelar, antes de ficar nessa lenga-lenga sem confirmação  .

Também se comentava muito sobre a permanência do Lewis na categoria, em 2021. Nas minhas notas ácidas da ocasião, eu já previ que Hamilton faria joguinho e corpo mole até o final do ano, pelo menos. 
E depois me dizem que eu "não conheço Lewis", pois se conhecesse, admiraria bastante... 

Como escrevi muito, peço que esperem até a próxima postagem com os dados do GP da Bélgica, possivelmente, semana que vem. Não vou chatear vocês até a exaustão. Estão liberados(as)!

Abraços afáveis!

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