Chapter 16: GP de Sakhir

Voltar ao circuito de Bahrein para outra corrida depois do acidente chocante do Romain Grosjean (ou se preferirem, "A Fênix") poderia ser um pouco estranho. Mas foi, também, por outros motivos.

Logo na segunda-feira, todo mundo estava num momento bem falso: ou estavam exaltando, tardiamente o franco-suíço (que até então era o "direção perigosa" favorito dos detratores de plantão) ou simplesmente ignorando o perigo que correu e pedindo para esquecerem o assunto.

Aqui em nossas terras, desistíamos de dar chance ao bom senso. Só se falava no sobrenome Fittipaldi, já que Pietro, neto do Emerson, seria o substituto de Romain na Haas. O que vou dizer é duro, porém real: é um saco ser brasileiro na F1 e ainda mais com um sobrenome desses. Mas o cara foi maduro - tanto nas declarações quanto na sua administração de classificação e corrida. Irá correr em Abu Dhabi - e de novo - pela Haas. Podemos ignorar tudo que vier, tanto de elogio exagerado, quanto comentários depreciativos.

Sua presença no último GP do ano (graças!!!), pois, apesar da minha torcida, Grosjean decidiu que não poderá voltar à um carro de F1 tão cedo e se despediu da pior forma possível, do paddock e da F1, ou seja, não dentro de um carro de corrida. Mas ele é o grande vencedor do ano; um vencedor da vida. Seu sorriso e "good spirits" farão falta no grid. Falo sem ser piegas: sim, Romain é um cara bacana e um bom piloto. Peço que não me julguem e não torçam o nariz para esse comentário. Ontem, conversei com umas pessoas nas redes sociais. Valerá a pena guardar esse detalhe particular para mais adiante, no texto, poder retomar.

No começo da semana, logo depois do GP do Bahrein, foi anunciado que Lewis Hamilton está com covid-19. Não se sabia exatamente como ele estava se sentindo (apenas que estava com sintomas leves)  e também, nem como teria contraído o vírus. O que dava para fazer era aguardar que ele se recuperasse e seria bem legal se a gente pudesse só contar com isso. 

O primeiro dos pilotos, a contrair a doença, foi Sérgio Pérez. Foi muito criticado por ter rompido "a bolha", inclusive pela mídia especializada. Um comentarista conhecido local, divulgou fotos de viagens do mexicano para o seu país e em "turismo" para a Itália, e claro... Muita gente (e eu inclusa) criticou a falta de responsabilidade, mas também abriu-se a jaula para "os haters" - surgiu declarações antigas, sobre assuntos de outra natureza, para acabar com o cara.

Ainda que tenha ficado tudo bem Sergio voltou ao cockpit sem maiores problemas. Seu nome surgiria novamente, por questões contratuais. Mais tarde, quem viria a ter a doença, seria justamente o seu companheiro de equipe. Substituído (também) pelo Nico Hulkenberg, durante o fim de semana do GP, Stroll estaria com um simples e comum "piriri". Passado o GP, afirmaram que ele estava com o novo coronavírus, mas se recuperando bem. 

Como havia passado um tempo até o exame dar positivo, algumas pessoas levantaram apenas a questão do falta do anúncio, mas nada semelhante às críticas que foram depositadas ao Sérgio Pérez. O mexicano tem experimentado todo o tipo de reação com a sua pessoa e trabalho: há os que o odeiam por um comentário machista no passado, e os que acham ele tão fantástico que não deveria ter sido demitido em detrimento de um *limpando a garganta* mero tetra campeão mundial (sim, contém sarcasmo - não pude evitar).

A lógica da F1 sempre foi essa: para se fazer conjecturas sobre algum piloto, se procura, ao máximo, fazer um rebaixamento de suas habilidades, exaltando as de outro. Nesse processo, se perde muito do que realmente pode ser preponderante ou próximo da totalidade. Vejam por quanto tempo Romain foi detratado. Às vezes, por pura birra e implicância. Ficou como o cara causador de um grande acidente em 2012 e pronto. Foi numa situação como essa, recortada por maldade mesmo (não vejo outro sentido que não esse), que fizeram ele ter a fama que tem. "Ah, as suas ações também colaboraram para isso." Opa! E ele foi o único a errar?

Conclusões são tomadas sem um milésimo de segundo de reflexão. No afã de ser o "bonzão" e a "boazuda" da parada, se posta opiniões e análises baseadas em achismos e há quem as compre. Assim sendo, criticar o Hamilton por ter se infectado com uma doença (que não é brincadeira,) e que, agiu com irresponsabilidade pois, se descuidou, é inadmissível. Mas tudo bem em acusar o Sérgio quando foi o primeiro a fazer isso. Ou antes, quando Valtteri Bottas e Charles Leclerc teimaram em voltar para casa, entre um GP e outro. Não se infectaram, mas funcionou como se tivessem.

Tudo bem também dizer que Lewis já venceu o campeonato, não precisa provar nada para ninguém. Pode ficar isolado e muito bem assistido por médicos, enquanto um monte de gente sem plano de saúde, e que contraiu a doença porque precisou sair para trabalhar, fique a míngua nos hospitais lotados e correndo o risco de outras infecções e negligência. Claro que isso é outro assunto, mas não seria se fosse outro piloto infectado e não ele. Duvidam?

Não digo que uma recuperação importa mais que a outra. Só chamo a atenção novamente para a contradição das coisas. Houve quem torcesse contra quem quer que fosse o substituto do Lewis, para não tirar os brilhos dos feitos do heptacampeão. Poxa, são mesquinhos a esse ponto? Caramba... A critério, Max Verstappen é o "bocudo": disse que 90% do grid ganha com o carro do Mercedes, e "isso está muito errado", comentaram por aí. Será?

Tendo um piloto reserva ao dispor, a Mercedes optou pela política: George Russell, o novo queridão dos jovens promissores, iria sair da Williams para conquistar seus primeiros pontos na melhor equipe do grid. Teorias brotavam: Toto Wolff estaria testando substitutos - descentes - para Hamilton. Outros disseram que essa opção era a melhor diante da não renovação de Lewis. Com um jovem muito rápido usando o carro dele, ele se sentiria ameaçado, e assinaria logo com a equipe (como se isso já não estivesse decidido). Haviam os que estavam curiosos: Max estava certo, ou não?

Se tem resposta rápida (mas, talvez, pouco inteligente) sobre a primeira questão é que Toto não precisa testar Russell. Ele sabe do que o menino é capaz ou não teria esnobado, totalmente, Stoffel Vandoorne que já havia pegado um avião para estar disponível. No fim, ele ficou apenas na frustração.

Acho uma bobagem dizer que Hamilton precisa ser pressionado a assinar. Seria ingenuidade ou burrice acreditar que ele está inseguro sobre vencer outro campeonato facilmente em 2021? Talvez as duas coisas juntas, afinal, se me lembro bem, quando Nico Rosberg anunciou aposentadoria, Toto disse que, ao avisar os chefes da equipe que havia um problema com um dos seus pilotos, eles acharam que Lewis tinha dado uma das suas. Deixar em suspenso, pelo visto, é divertido para Big Lewis e a Mercedes já lida com isso, faz um tempo. 

De todo modo, por mais que ele afirme que está repensando as coisas, que o acidente do Grosjean, as questões políticas e ambientais mostrem outras perspectivas, Lewis apenas está explorando o seu lado fantástico e perfeito, muito bem pintado pela mídia. Sem defeitos, agindo assim ele sinaliza que é um puta cara consciente. Mas na verdade, ele sabe que 2021 está ganho. Por isso ele faz esse joguinho de suspense e volt ano que vem, como se nada tivesse acontecido e dizendo que está motivado como nunca, trabalhando 8 dias na semana para ter... o oitavo título.

Com os treinos livres, posso dizer que Russell é muito bom. E sim, Max sempre tem muitas chances de estar certo. Para ser sincera, critica-se muito as suas falas, mas as poucas que eu acompanho, não são completas inverdades.  Então, sou dessas: acredito sinceramente que, por mais que eu não goste de um piloto do atual grid da F1, ele está lá por mérito - ainda que eu não consiga enxergar (ou admitir) qual. Portanto, acelerar, ter reflexo rápido, saber ultrapassar e fazer boas largadas, são coisas que TODOS são capazes, independente de qualquer opinião que se tenha a respeito. Portanto, são pilotos. E por piloto bom, num carro excelente, seja ele qual for, será visto como sobrenatural. Sempre!

Estou ciente de que há controvérsias sobre "ser piloto". Penso que todos são ou teríamos, todo dia, manchetes deles sendo infratores nas ruas de suas cidades. Eles tem percepções rápidas, lidam com espaços melhor que nós todos somados e lidam muito bem com alta velocidade. Mas eles não são robôs, então aqui vai uma novidade: eles erram! Uns mais do que os outros por uma combinação de fatores que são, muitas vezes deixadas de lado por tagarelice. 

Sabem o Grosjean? Pois ele procurou ajuda profissional para lidar melhor com os fracassos, mesmo assim, choveu crítica no cara. Para quê, a gente não sabe. Provavelmente por maldade mesmo. Semana passada li um punhado delas. Apelidos maldosos, comentários ridículos sobre a sua largada. Fãs do piloto cutucaram uma turma que "descobriu que Romain é gente fina". Antes tarde do que mais tarde, mas acreditem, não foi a maioria, nem foram os justos. Muita gente boa quis, e até fez comentários, totalmente desnecessários a respeito de Romain.E ontem, fizeram o mesmo com Bottas. Como diria Sartre: "o inferno são os outros"...

Quem acompanhou a transmissão da F1 pela Globo não vai admitir nunca, mas foi repulsivo e quiçá, nojento, a forma como Bottas foi tratado enquanto ser humano. Pegaram pesado. E pega-se pesado com ele e tantos outros o tempo todo. O que se ganha com isso? Não se admite falhas e por isso, perdem a mão mesmo, analisando o cara por baixo, passando uma imagem de que o cara é um inútil, uma porcaria. Ganha-se adeptos e propagadores do discurso. Mas ganha o desprezo de quem sabe que não é bem assim que deveria ser a "informação" jornalística. 

Não, Bottas não pode errar. Ele não pode ser fraco psicologicamente diante de uma magnanimidade que é Lewis ou mesmo, diante de um novato cuja a hype está lá em cima e tem o aval do chefe da equipe. "We race as one" que a F1 tascou como marketing e que foi criticada em alguns momentos de manifestação por direitos civis é também fachada no debate da mídia dita "especializada" (encabeçada pelo narrador e comentarista da emissora) e mais ainda: pelos seguidores (babões, diga-se) nas redes sociais.

O que não cabe nesse debate todo - e disso, tomo emprestada as teorias literárias e um tweet do Will Buxton - é que não se admite a característica cinza das pessoas. O mundo só pode ser dominado pelos absolutamente perfeitos, plenamente bons. Tomem qualquer personagem contemporâneo que vocês gostem e analisem: ele (ou ela) nunca é totalmente bom ou totalmente mau. Os mais bem feitos personagens ficcionais são cinzas. Porque a vida é cinza. Nada passa incólume por nós. Tudo nos afeta, nos atinge e imprime um resultado diferente e nós.

Isso acontece também na F1. Não existe forma de Bottas ser o cara que se espera se os meios para isso estão completamente fora das possibilidades no momento. Ele não tem a equipe voltada para ele, ele sequer tem uma fanbase forte que o apoie. A gente não sabe até que ponto, seus engenheiros fazem o carro na medida certa de sua habilidade para ser igual ou melhor do que Lewis. A mídia faz do fracasso mental do cara, uma sabatina humilhante. A que custo? Fazer disso uma grande horda de expectadores tóxicos, afastando os que entendem do assunto por estarem cansados, gerando uma guerra campal desmedida e desproporcional. 

A Ferrari, por exemplo, é uma desgraça à parte. Após a primeira curva, perderem a sua prima-dona deram de ombros para o segundo piloto ainda na pista e com chances reais - caso quisessem trabalhar para ele - de pontuar. Simplesmente, não quiseram. E, boquinha de siri sobre o que foi feito pelo Leclerc para cima de Pérez depois da largada. Na corrida passada, Sebastian Vettel era o chorão por ter reclamado que o monegasco não deixar espaço. É exatamente isso que não faz sentido entre os "entendedores" de plantão. 

Depois da lambança do pitstop da Mercedes ficou claro que, sem o seu homem do jogo, eles são verdadeiras baratas tontas. Deram de Ferrari. Mas a Mercedes errando? Pois é. Acontece. São humanos, fazer o quê? Vale uma humilhação? Talvez não, pois vejam bem: justo quando muitas teorias colocariam um monte de outras à prova, eles vão lá e fazem "caquinha". Percebem que, quando não é para ser, não é mesmo? Não é por causa de ontem que a Mercedes deixou de ser hegemônica. É suspeito que, quando justamente o seu piloto principal não está por perto, isso aconteça, é, mas precisamos de sensatez. Foi uma fatalidade.

Justo quando Russell estava liderando a corrida, de ponta a ponta, segurando Bottas, como um piloto gente grande, fazendo voltas rápidas - barba, cabelo e bigode - decidem fazer uma parada dupla e que dá problema de execução. Russell vencendo essa corrida corroboraria com a tese do "qualquer um vence com esse carro", criaria uma expectativa maior ainda com relação a ele e colocaria (como já colocou, muita gente se encarregou disso) uma pedra na carreira de Bottas. A gravidade de tudo o que essas analogias implicam, é doloroso e irresponsável se não for feita com cuidado.

Depois de toda a bagunça, a ultrapassagem de Russell sob Bottas foi feita aos berros - sim aos berros absurdos e intoleráveis - pela transmissão da Globo. Eu diria que agradeço por ano que vem poder procurar outro lugar para assistir corridas. Ninguém disse que os pneus eram diferentes e obviamente, que Bottas já estava muito pilhado de raiva por terem errado o pit. Só ficou a questão: Bottas é fraco, não merece o carro que tem. Se alguém queria Lewis de volta, agora querem que ele volte a Abu Dhabi (sem sombra de dúvida vai estar presente), mas que Bottas seja demitido, afinal... Ele não presta. 

Quem presta? Reformulando: porque quem VOCÊ acha que presta é verdade absoluta?

Semana passada, Pérez estourou o motor nas voltas finais e isso deu chance para Alex Albon subir ao pódio. Ninguém deu a mínima para o fato. No sábado, li comentários de que o Albon não dá mais... "We race as one", mas só em alguns casos. Quando um cara destes, sobe ao pódio logo se diz: "só foi parar lá porque o seu rival para roubar a vaga estourou o motor antes". Quando Leclerc chega ao pódio por abandonos de outros, ele "tira leite de pedra". Para um, o resultado é sorte, para outro, o resultado é desempenho.

Esse incidente da Mercedes legitimou a vitória do Pérez - aquele que todo dia alguém fala que é um absurdo não ter um carro para chamar de seu em 2021. O cara foi tocado logo depois da largada e caiu para último. Saiu do P18 para chegar em P1. Daniel Ricciardo declarou que era uma coisa boa, mas ontem, todos perderam: não se pode deixar que um cara que está em último por conta de toque nas primeiras curvas, ganhe uma corrida. Ninguém disse um pio, afinal é o Ricciardo. 

E ele não está errado. Até porque a corrida era das duas Mercedes. Pérez, seria no máximo, o terceiro, se não fosse o incidente da Williams de Aitken. E ainda assim, haveria um tom de derrota para os demais, pois esse terceiro seria vitória para ele. Mas a alegria não parou aí, pois logo em segundo, estava Esteban Ocon. Pulou aí a piadinha que a Renault fez certo em substituir o Hulk - que não tem pódio - por ele? Pois é. A humilhação não tem limites!! Em terceiro, o grande Lance Stroll. Todos os três merecedores de glórias, que lindo pódio...

Está bem, estou sendo sarcástica. Só eu que não posso fazer uns comentários depreciativos? Só podem fazer isso os grandes jornalistas analistas e entendedores de redes sociais? Caras velhos e que assistem F1 desde criança, ou moças bonitas que sabem trocar um pneu? Então, eu peço desculpas pela minha insignificância. 

Pérez,  que teria um ano de stand by, logo será anunciado na Red Bull, para quem achava um absurdo ele não ter um carro bom. Tomara que essa segunda ou terceira chance, faça dele, campeão mundial.  O Ocon pode contar vantagem do feito, só não sei por quanto tempo, pois Fernando Alonso está vindo aí.  Espero que volte com tudo, e não como um senhor idoso. E Stroll ano que vem estará nos braços da galera. Será menos odiado porque vai ser companheiro de outro que ninguém gosta muito - a verdade é que todo mundo só está esperando uma brechinha para voltar a odiar Vettel. 

Sobre pódios, é o seguinte: se nem todos são pilotos, nem todo pódio é atestado de qualidade. Dito isso, arrumem outro argumento para falar quem é bom ou ruim, porque eu estou tirando o meu time de campo. Logo, vocês nem escutarão mais falar de mim. 

Snceros abraços afáveis e até Abu Dhabi!

Comentários

Mário Paz disse…
Russell atrapalhando o script da poderosa Mercedes, a gestão corporativa mais fantástica da F1, onde se combina até mesmo quantos segundos de vantagem é permitido impor sobre os demais carros, problemas técnicos e dificuldades diversas podem ser lançadas a qualquer momento pelo rádio durante a corrida com o propósito de enaltecer as qualidades do hepta campeão, obviamente discutidas previamente com a equipe de marketing do homem...é possível que a Mercedes genuinamente tenha se atrapalhado nos pits em razão do caos instalado, pois alguém ousou pegar o carro do rei Lewis e partiu acelerando na frente de todos os demais, causando cenas embaraçosas dentro da garagem mercêdica, homens fortes da equipe batendo cabeça pela "desobediência" do garoto, que deveria vir com aquele discurso pronto de "vim para somar, aprender com a experiência do Lewis etc"...não entendo como ninguém pensou em colocar o George "ao vivo via satélite" momentos antes da largada desejando pronta recuperação para o Lewis ...o irônico é que o LH44 cansado de guerra e superfamília agora deseja ardentemente disputar o último GP do ano ! Abalou kkkkkkkk
Manu disse…
Pois então, Mário! Concordo com tudo!
Super estranho que, mesmo não estando 100%, Lewis não pestanejou em voltar, não é mesmo? ¬¬'
O que mais me intriga é que, ninguém teve coragem de falar o quanto isso soava irresponsável e arrogante em certa medida.
Se fosse um latino americano, talvez a imprensa teria chiado, mas como não é o caso, passou como "superação"... Ah, #paciência!

Postagens mais visitadas deste blog

Aquaman post

Corrente Musical de A a Z: ZZ Top

Boas festas 2021!